Catástrofe, crise, desaparecimento, extinção, ameaça, medos, riscos, descrença, colapso, desastres. Com a intensificação da ocorrência de eventos extremos e alterações climáticas, vivemos a disseminação de enunciados niilistas marcados pelo fim e pela vontade de nada, trazendo novo fôlego para o velho catastrofismo. Proliferam distopias em torno de uma ausência de futuro à qual estaríamos condenados. A sensação de que “não há saída”, por vezes, coloca-nos diante da impotência do pensamento para avaliar situações que se tornaram impensáveis em relação ao modo com o qual estamos habituados a lidar com o tempo, o humano, a natureza, o corpo, o espaço, a cultura, a tecnologia, a política… A contemporaneidade lança-nos o desafio do enfrentamento da extinção de espécies animais e vegetais, da erosão do solo, da elevação do nível da água, das modificações extremas de ambientes e paisagens, do colapso dos recursos hídricos, mas também e, conjuntamente, do desaparecimento, erosão e colapso das existências singulares, humanas e não humanas, aí implicadas, problematizando os modos de pensar a preservação e a conservação, a gestão pública, e as reinvindicações por visibilidade e justiça que nos chegam de todas as partes. Diante de tantos desaparecimentos afirma-se a urgência ética, estética e política da criação de outros pensamentos, narrativas, conceitos, imagens, práticas, ações, fabulações, ficções-científicas, especulações… Como podemos fazer aparecer outros modos de existência nas situações
de contingência? A partir de quais lógicas de funcionamento a comunicação, as ciências, as tecnologias, a filosofia e as artes têm feito aparecer os desaparecimentos em seus bancos de dados, coleções, museus,
patrimônios, catálogos, acervos, inventários, pesquisas e escritas? Diante da obsessão contemporânea com a criação de arquivos e seus movimentos de coleta, identificação, codificação e documentação, como fazer durar o acontecimento? Como tornar possível a extração de forças de vida dos arquivos? Para dar corpo e consistência a outros modos de dizer, escrever, ver e escutar o “Desaparecimento”, tema desta terceira edição da revista ClimaCom Cultura Científica – Pesquisa, Jornalismo e Arte, apresentamos duas entrevistas, com a filósofa belga Isabelle Stengers e o filósofo e sociólogo francês Bruno Latour, e uma série instigante de produções artísticas e de artigos de pesquisadores brasileiros e também da Austrália, Catalunha e Colômbia que põem em jogo as multidimensões do desaparecimento implicadas nas mudanças climáticas. Não se trata apenas do que desaparece nesse complexo e mutante cenário, mas de como o pensamento e a sensibilidade tomam para si o desaparecimento para fazer dele a ocasião de incontáveis e surpreendentes aparições.